quarta-feira, 26 de novembro de 2008

SEDAÇÃO NÃO É ANESTESIA GERAL, MAS PERMITE UM TRABALHO TRANQÜILO E COM SEGURANÇA

SEDAÇÃO NÃO É ANESTESIA GERAL, MAS PERMITE UM TRABALHO TRANQÜILO E COM SEGURANÇA
José Ranali
O controle medicamentoso do estresse em odontologia é muito útil ao Dentista e ao paciente. A literatura é rica em mostrar as vantagens da sedação em suas várias formas e métodos. Os benefícios vão desde um tratamento com menor risco ao paciente, tornando-o mais cooperativo e permitindo ao dentista realizar um tratamento mais confortável, seguro e com menor quantidade de anestésico local, até em diminuir o estresse profissional, hoje reconhecido como um fator de doença ocupacional.
De maneira geral, no Brasil, o controle do estresse e da dor na clínica odontológica ainda não é rotina, provavelmente devido a pouca atenção dada a esse tema durante a formação profissional do dentista, até mesmo em relação às formas mais conhecidas de sedação, como o uso de benzodiazepínicos por via oral. É importante, pois, que o dentista brasileiro conheça e domine as diversas formas de sedação consciente que podem ser empregadas na clínica odontológica já que, quando corretamente aplicados, são métodos seguros e eficazes. Entre eles, a Sedação Consciente Inalatória com o óxido nitroso e o oxigênio (NO2 /O2) é o mais seguro e previsível. Outras denominações desta técnica são: Analgesia Gasosa; Analgesia Inalatória; Analgesia Relativa; Psico-sedação; Cônscio-sedação; Sedação Consciente; Sedação por Inalação e Sedação Consciente por oxigênio/óxido nitroso.
Desde há décadas o óxido nitroso vem sendo utilizado com sucesso em odontologia como uma substância que administrada por via inalatória, através de técnica específica, proporciona efeito relaxante (ansiolítico) e analgesia relativa (diminuição da resposta dolorosa).
Nos EUA e em vários outros países, a Sedação Consciente com NO2 /O2 é utilizada rotineiramente como um dos métodos mais previsíveis e seguros de sedação em odontologia. Infelizmente no Brasil houve sempre confusão em relação à sua utilização pelo dentista. A principal delas é confundir SEDAÇÃO CONSCIENTE com Anestesia Geral. Partindo dessa falsa premissa, até hoje as opiniões contrárias ao uso de óxido nitroso sustentam que o dentista não deve aplicar anestesia geral no consultório e que a anestesia geral somente deve ser administrada por médico anestesista e em ambiente hospitalar, o que é absolutamente correto.
Para não haver confusão entre as duas coisas é interessante observar as definições estabelecidas pela ADA (American Dental Association) em 1997:
Sedação Consciente é definida como "uma depressão mínima do nível de consciência do paciente que não afeta sua habilidade de respirar automática e independentemente e de responder apropriadamente à estimulação física e a comando verbal, e que é produzida por método farmacológico, não farmacológico ou pela combinação deles". Segundo essa definição, o paciente consciente é "aquele que tem intacto seus reflexos protetores, incluindo sua habilidade de respirar, e que é capaz de responder a pergunta e a comando verbal".
Anestesia Geral é definida como "um estado controlado de inconsciência, acompanhado por perda parcial ou completa dos reflexos protetores, incluindo a habilidade de respirar com independência e de responder voluntariamente a estimulação física ou a comando verbal, e que é produzida por método farmacológico, não farmacológico ou pela combinação deles".
Alguns autores 2,3 afirmam que a sedação com a mistura de óxido nitroso/ oxigênio e a anestesia local formam uma conjunção quase perfeita para o controle da dor e da ansiedade durante o tratamento odontológico, proporcionando conforto e segurança ao paciente. Por ser uma técnica segura não há registrado na literatura nenhum relato de caso fatal ou de complicações graves com o uso de óxido nitroso/oxigênio. Ressalve-se, porém, que algumas técnicas de sedação consciente combinam óxido nitroso com outras drogas depressoras do SNC. A combinação de duas ou mais drogas depressoras leva a um estado mais acentuado de depressão do SNC e, portanto, devem ser cuidadosamente administradas. Embora realizadas em vários países, defendo que estas técnicas não sejam realizadas por dentistas brasileiros.
Levando-se em consideração as definições acima, pode-se comparar e acentuar algumas diferenças entre as duas situações, conforme o quadro abaixo:
Algumas Diferenças entre SEDAÇÃO CONSCIENTE e Anestesia Geral
(Ranali, 20013).
SEDAÇÃO CONSCIENTE
Anestesia Geral
Paciente acordado (consciente)
Paciente dormindo (inconsciente)
Respira voluntariamente
Respira através de aparelho
Máscara nasal (não entubado)
Sistema fechado (entubado)
Não há combinação de outros fármacos*
Há combinação de outros fármacos
Não provoca analgesia completa**
Provoca analgesia completa
Obedece a comando verbal
Não obedece a comando verbal
Responde a estímulo físico
Não responde a estímulo físico
Não perde reflexos protetores***
Perde os reflexos protetores
Não existe período de recuperação
Depende de período de recuperação
Não restringe as atividades do paciente
Restringe as atividades do paciente
* - com exceção dos anestésicos locais; ** - o controle da dor depende do uso
de anestésicos locais, isto é, a sedação consciente e a anestesia local são
usadas conjuntamente; *** - entre outros, o da tosse e da deglutição.
A técnica Sedação Consciente com NO2 /O2 é de simples aplicação e realizada com um aparelho (fluxômetro) específico para a dispensação do óxido nitroso e do oxigênio. É interessante notar que o aparelho possui algumas características para proporcionar maior segurança à administração
Anais do 15° Conclave Odontológico Internacional de Campinas
ISSN 1678-1899- n.104 - Mar/Abr - 2003
dos gases, ou seja, em qualquer circunstância há sempre o oferecimento de, no mínimo, 30% de oxigênio, quantidade uma vez e meio maior que o oxigênio contido no ar atmosférico (20,94%). A técnica permite aumentar gradativamente a concentração de óxido nitroso da mistura de modo que se pode atingir o grau de sedação e analgesia adequados para cada paciente e isso, geralmente, ocorre com a proporção de 30 a 40% de óxido nitroso para 70 a 60% de oxigênio.
Além disso, o paciente não precisa ficar respirando durante todo o atendimento a mesma proporção de óxido nitroso, mas somente durante os procedimentos estressantes como, por exemplo, durante a injeção anestésica. No restante do tempo pode receber a mistura em proporção inferior como, por exemplo, 20%:80% de óxido nitroso e oxigênio, respectivamente. Essa baixa concentração é suficiente para manter a maioria dos pacientes relaxados e cooperativos. É interessante notar que se administra uma alta concentração de oxigênio ao paciente (80%) o que é positivo, pois, nos últimos anos, tem sido recomendado que para certos pacientes odontológicos - como os portadores de alterações cardiovasculares - deva ser oferecido oxigênio durante o atendimento. Nada melhor, então, do que sedar e oxigenar simultaneamente.
Recomenda-se, também, que ao final da administração da mistura de óxido nitroso e oxigênio, seja oferecido 100% de oxigênio, durante 3 a 5 minutos, para o adequado retorno do paciente às suas condições normais, evitando-se a possibilidade dele apresentar qualquer desconforto devido à rápida eliminação do óxido nitroso.
A Sedação Consciente com NO2 /O embora previsível e segura, não pode, entretanto, ser considerada uma panacéia. Ou seja, apesar de a técnica ter indicações para muitas situações odontológicas, alguns pacientes não a aceitam e, nessas circunstâncias, o profissional deve evita-la. Em outras ocasiões, não é bem indicada, pois poderá haver necessidade de uma sedação mais profunda ou até mesmo de anestesia geral, situações específicas que fogem da competência do dentista.
Fora isso, praticamente a técnica não representa risco para o paciente. Deve-se sempre lembrar que a oferta de oxigênio ao paciente é sempre superior ao que normalmente ele respira. Esse detalhe é importante porque, até hoje se fala na questão da hipóxia que pode ocorrer durante a administração do óxido nitroso. Isso era comum nos primórdios do uso do óxido nitroso (final do século retrasado), quando era usado como anestésico geral e isoladamente, sem estar misturado com oxigênio. Por volta de 1870, quando se começou a misturar 20% de oxigênio ao óxido nitroso e, também, com o advento de aparelhos para dispensação de gases, a técnica tornou-se de uso amplo em odontologia e, principalmente, muito mais segura.
Isso quer dizer que não existe a possibilidade do aparelho apresentar algum tipo de falha e que gases passe a dispensar somente o óxido nitroso sem o oxigênio ou, ainda, de o profissional trocar os cilindros dos dois gases e administrar equivocadamente o óxido nitroso imaginando que seja oxigênio e vice-versa. Nenhuma dessas duas ocorrências é possível, pois os aparelhos possuem dispositivos de segurança que impedem em qualquer situação a administração isolada de óxido nitroso. Ao contrário, toda vez que há uma alteração do fluxo normal de oxigênio cessa-se completamente o fluxo de óxido nitroso. Por outro lado, a troca de cilindros é praticamente impossível, pois as roscas dos cilindros de óxido nitroso e de oxigênio são de medidas diferentes, além do que os cilindros também são de cores diferentes, seguindo convenção internacional, azul e verde, respectivamente, para óxido nitroso e oxigênio.
Embora raras podem ocorrer complicações se NO2 /O2 não forem seguidos alguns cuidados durante a execução da técnica. Por exemplo, se a administração do óxido nitroso for prolongada e em concentrações altas, pode haver náusea e até mesmo vômito. Também, com concentrações acima de 50% de óxido nitroso e por tempo prolongado, alguns pacientes podem apresentar algum grau de excitação. Nesses casos, deve-se interromper o fluxo de óxido nitroso e manter o oxigênio em 100%. Outra complicação é a hipóxia residual, que ocorre somente se ao final da administração da mistura não for oferecido 100% de oxigênio, durante 3 a 5 minutos, como recomenda a técnica. Esta hipóxia é resultante da rápida eliminação do óxido nitroso e é completamente evitada pela administração de oxigênio ao final da sedação.
Portanto, já está suficientemente comprovado que a Sedação Consciente Inalatória com NO2 /O, quando associada à anestesia local, promove um controle eficiente da ansiedade e da dor durante o tratamento odontológico, sem riscos à vida do paciente e que não se constitui e nem se caracteriza como anestesia geral, pois a concentração de óxido nitroso e a técnica de administração são diferentes daquelas empregadas na anestesia geral. Também se deve considerar que o seu uso está dentro dos estritos limites da área de atuação profissional do dentista.
Assim, o importante é discutir como treinar adequadamente o dentista para torna-lo apto a usar a técnica e discutir os perigos de se usar equipamentos e gases de procedência duvidosa e que, infelizmente, já estão sendo oferecidos inescrupulosamente para os colegas. Agindo assim, seremos capazes de obter os melhores resultados que essa técnica de sedação pode proporcionar.
BIBLIOGRAFIA
1 - AMERICAN DENTAL ASSOTIATION. Guidelines for teaching the comprehensive control of anxiety and pain in dentistry. www.ada.org , 2000.
2 - CLARK, M. & BRUNICK, A. Handbook of nitrous oxide and oxygen sedation. 1°ed, Mosby, St. Louis, 1999.
3 - MALAMED, S.F. Sedation – A guide to patient management. 3°ed, Mosby, St. Louis, 1995.
4 - RANALI, J. Óxido Nitroso: porque usar. Jornal da APCD, v. 36, n. 529, p. 32-4, 2001.

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Quem sou eu

Joinville, Santa Catarina, Brazil
Por Ricardo Toscano, Cirurgião-Dentista graduado pela Unifal, especialista em odontologia do trabalho pela UFSC, mestre em odontologia area de concentraçao em implantodontia cirurgica/protetica pelo Instituto latino Americano de Pesquisa e Ensino Odontologico,reabilitador oral clinico. Responsável técnico pelo Instituto Odontologico Toscano. Notícias,ferramentas e artigos na área de Reabilitação Oral com ênfase na interdisciplinaridade e multidisciplinaridade.